Em tempos em que dizer – o clichê – que eu te amo virou bom dia, é preciso fazer uma explicação prévia do que é paixão antes de chegar no ponto principal desse texto.
A paixão é um estado psicológico alterado e transitório, não necessariamente patológico (nas pessoas com problemáticas ele é patológico) que cria uma sensação de euforia, pensamento acelerado e repetitivo, comportamentos centrados no alvo de amor. Segundo os psicólogos evolucionistas é responsável por garantir a reprodução da espécie ao criar o enlace necessário por tempo suficiente para a procriação. Ele tem duração que varia em intensidade em até três anos, visto que a carga de estresse gerada (cortisona produzida em excesso) pela sua existência afetaria a saúde do corpo.
Do ponto de vista mais profundo a paixão é um jogo de espelhos onde se projeta o que é idealizado em si mesmo numa figura externa. Se apaixonar, portanto, é uma forma de se ver melhor por meio de outra pessoa. Por consequência é um estado um pouco soberbo e narcisista e irreal. Irreal porque as virtudes são superestimadas (visto a quantidade enorme de desilusões pós-paixão) e os defeitos são ocultados (basta checar as decisões ruins tomadas neste estado).
A pessoa que se apaixona fácil pode ser analisada facilmente sob esse prisma como alguém que falta um senso de importância estável e uma capacidade de ponderar suas ações com racionalidade. Ainda que ela possa se ver como alguém que se entrega sem medo e cai de cabeça na verdade isso é uma racionalização de sua inabilidade de manter sua imaginação sob controle.
A pessoa com paixonite súbita consegue distorcer as aparências com muita facilidade e por isso deveria ser considerada pouco confiável em seu julgamento. Alguém que consegue declarar amor e fazer promessas para uma vida inteira para uma pessoa diferente a cada mês ou semana deveria ser colocada em quarentena emocional, no mínimo existe algo perturbador ali.
Imaginar um futuro glorioso com um semi-desconhecido não pode ser considerado símbolo de entrega. Conhece-se uma pessoa bem com um tempo de convívio de dois anos. Obviamente que a paixão não precisa ser obstruída nesse tempo, mas as decisões mais importantes devem ser preservadas para depois de um ano mínimo de convivência considerável. O apaixonado súbito decide morar junto, vender seus bens, abandonar emprego, ter um filho, romper amizades significativas em nome de cada “amor” insano.
Em alguns poucos casos o resultado (que só pode ser medido depois de certo tempo) é bem sucedido. Na maioria o que se vê são decisões prematuras que resultam em magoa, desilusão, acusações afetadas e um novo ciclo de paixonite para “curar” a anterior.
Confesso que olho com certo carinho quando vejo pessoas que se aventuram de galho em galho como se buscassem uma resposta religiosa e fanática no relacionamento amoroso. Fica claro o vazio subliminar de uma vida que só se vê realizada na presença asfixiada de um outro. O amor que ela precisa é por si mesma, mas não desse que a deixa cega e sim o que desperta autoconhecimento de qualidade, sem enganos ou autoilusões.
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